Inimigos Naturais de Pragas Agrícolas

Caixa entomológica e texto: Daiane Carmo, Daniel Neves e Lucas Arcanjo.

Editoração: Douglas da Silva FerreiraMaisa de Carvalho Gonçalves e Marcela Miranda de Lima

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O manejo integrado de pragas (MIP) pode ser definido como uma filosofia de manejo sustentável que visa integrar táticas de controle a fim de reduzir populações de pragas a um nível que não causa prejuízos econômicos, ambientais e sociais. Dentre as táticas de controle utilizadas no MIP está o controle biológico de pragas. O controle biológico é o uso de organismos vivos capazes de suprimir populações de pragas. Os insetos que atuam como agentes de controle biológico compõem o grupo dos inimigos naturais, o qual é formado pelos parasitóides e predadores.

De forma simples pode-se dividir o controle biológico em natural ou aplicado. O controle biológico natural refere-se à população de inimigos naturais que ocorrem naturalmente no campo, como exemplo podemos citar os besouros predadores, Chrysopidae e tesourinhas. Já o controle biológico aplicado refere-se à manipulação do ambiente de cultivo ou liberação de organismos para o manejo de pragas, como exemplo podemos citar a vespinha parasitóide Cotesia flavipes.

Os parasitoides mais utilizados no controle biológico estão na ordem Hymenoptera e Diptera. Dentro de Hymenoptera as famílias mais utilizadas são Braconidae, Ichneumonidae, Trichogrammatidae, Eulophidae e a superfamília Chalcidoidea (Pteromalidae, Encyrtidae e Aphelinidae). Dentre os dípteros, a família mais usada é Tachinidae.

Dentre os predadores, os que apresentam maior contribuição para o controle biológico são: Anthocoridae, Anthicidae, Pentatomidae, Reduviidae, Carabidae, Cantharidae, Coccinellidae, Staphylinidae, Chrysopidae, Syrphidae, Histeridae, Dolichopodidae, Asilidae, Vespidae e Formicidae.


Predadores

Besouros predadores

Anthicidae – São insetos geralmente de corpo alongado, com uma constrição na cabeça formando um “pescoço”. O comprimento do seu corpo varia entre 1,5 a 15 mm. Alimentam-se de pequenos artrópodes, fungos e pólen.  São predadores de pulgões, ácaros e lagartas (ovos e pupas) .

Besouro da família Anthicidae – Foto: Udo Schmidt (CC BY-SA 2.0)

Cantharidae – São besouros de corpo mole, alongado, achatado e de coloração variada (preto a vermelho). O comprimento do seu corpo varia de 3 a 30 mm. Possuem hábito diurno e são encontrados sobre folhagens e flores. Alimentam-se de outros insetos, néctar e pólen. Eles predam pulgões em plantas, arbustos e árvores. Também predam ovos de Chrysomelidae em eucalipto e larvas de Diptera e Lepidoptera.

Besouro da família Cantharidae – Foto: Pierre Bornand (CC BY-NC 2.0)

Carabidae – São besouros escuros, castanhos ou coloridos de porte variado (1 a 80) mm e com pernas longas. São bons corredores e raramente voam. A maioria destes besouros habitam a superfície do solo, mas algumas espécies forrageiam na parte aérea das plantas. Em geral são generalistas e são ativos a noite. Predam pragas em pastagens e grandes culturas (milho, soja e trigo) como pulgões, lagartas, lesmas e caracóis. São capazes de ingerir uma quantidade de alimento equivalente ao seu próprio peso por dia. A população de carabideos decresce com o revolvimento do solo.

Besouro da família Carabidae – Foto: Udo Schmidt (CC BY-SA 2.0)

Coccinellidae – São conhecidos popularmente como joaninhas. Possuem porte pequeno a médio (0,8 a 11) mm, corpo compacto e convexo dorsalmente. As joaninhas são agentes de controle biológico natural podendo predar mais de 100 pulgões por dia. As larvas e os adultos predam pulgões, cochonilhas, mosca branca, tripes e outros artrópodes nas mais diversas culturas agrícolas (hortaliças, grandes culturas, fruteiras e ornamentais). Além disso, é o principal exemplo de sucesso de controle biológico clássico na agricultura (Rodolia cardinalis x Icerya purchasi) em cultivos de citros na Califórnia.

Besouro da família Coccinellidae (Joaninha) – Foto: Giuseppe Lacalandra (CC BY-NC 2.0)

Histeridae – Adultos podem ser predadores ou comedores de carniça. As larvas geralmente são predadoras. Possuem antenas curtas, com escapo longo e clava trímera, os últimos segmentos abdominais são descobertos. Os adultos de Haematobia irritans (Linnaeus) (Diptera, Muscidae) são hematófagos, constituindo-se em um dos principais insetos-praga do rebanho bovino nacional; suas larvas desenvolvem-se nas massas fecais, onde também são encontrados outros insetos. Seu principal método de controle é o químico, porém os histerideos predadores podem contribuir para regular as populações dessa praga.

Besouro da família Histaeridae – Foto: Udo Schmidt (CC BY-SA 2.0)

Staphylinidae – São besouros conhecidos popularmente como potós e são a segunda maior família dentro de Coleoptera. São insetos de forma variável (geralmente corpo alongado), corpo esclerotizado e a maioria possui élitros curtos. Seu tamanho varia de 1 a 40 mm de comprimento. A maioria das espécies são noturnas e preferem ambientes úmidos. Cerca de 17% das espécies estão presentes em ambientes agrícolas. Os stafilinideos de importância agrícola geralmente habitam a superfície do solo. Ambos larvas e adultos predam tripes, fungus gnats, ácaros, larva arame (Elateridae) e cochonilhas em culturas como brócolis, cebola, couve, cana de açúcar e milho.

Besouro da família Staphylinidae ou Potó – Foto: Ryszard (CC BY-NC 2.0)

Percevejos predadores

Anthocoridae – São percevejos ovalados ou alongados, escuros, variando de 1,4 a 4,5 mm de comprimento. Vivem sobre flores, onde predam outros insetos, mas algumas espécies complementam sua dieta sugando pólen ou outras partes das plantas hospedeiras. São muito utilizados em estudos de biologia, em testes de fatores abióticos, desenvolvimento de ovos e ninfas, testes com inseticidas, entre outros. Algumas espécies são usadas no controle biológico de pragas agrícolas, como as dos gêneros Orius e Geocoris. Muito encontrados em hortaliças e trigo auxiliando no controle de ácaros, ovos, larvas, lagartas, pulgões, percevejos, besouros, tripes e outros pequenos insetos.

Percevejo do gênero Geocoris – Foto: Boris Loboda (CC BY-NC-ND 2.0)

Pentatomidae – São percevejos de corpo geralmente ovoide. Antena com cinco artículos (algumas espécies com quatro). Escutelo amplo, triangular. Tarsos trímeros, às vezes dímeros. Os insetos da subordem Heteroptera são predominantemente fitófagos, mas há um número considerável de espécies entomófagas. Aqueles da subfamília Asopinae são encontrados em ambientes naturais, em sistemas agrícolas e associadas aos surtos de lepidópteros desfolhadores em áreas de reflorestamento com eucalipto. Os percevejos predadores, Brontocoris, Podisus e Supputius, são citados como os representantes de Pentatomidae mais pesquisados no Brasil, sendo de grande ocorrência e relevância como agentes de controle natural de insetos-praga em diversas culturas. Podisus é comum na cultura da soja e também se constitui em um dos principais agentes de controle biológico de lagartas em algodoeiro e cafeeiro.

Percevejo do gênero Podisus predando lagarta – Foto: José Roberto Peruca (CC BY 2.0)

Reduviidae – Conhecidos popularmente por percevejos assassinos pelo hábito predador. Apresentam cabeça geralmente alongada e constrita atrás do olho composto grande. Frequentemente com um par de ocelos. Rostro com três artículos aparentes (raramente quatro), recurvado, curto e grosseiro, raramente reto e flexível. Membrana com duas células basais, de onde partem poucas veias. Os reduviideos são encontradas em ambientes naturais, em sistemas agrícolas e associadas aos surtos de lepidópteros desfolhadores em áreas de reflorestamento com eucalipto. Constituem-se em agentes naturais de controle de ninfas e adultos de Mahanarva posticata em cultivos de cana-de-açúcar. E também ocorrem em ambientes hortícolas em manejo orgânico na região de Viçosa – MG.

Percevejo da família Reduviidae – Foto: budak (CC BY-NC-ND 2.0)

Moscas predadoras

Asilidae – São dípteros relativamente comuns, variando entre 3 e 50 mm de comprimento. São predadores ativos de insetos em geral e aracnídeos. Os adultos imobilizam a presa injetando saliva que contém enzimas neurotóxicas e proteolíticas. São frequentemente encontrados nas extremidades de galhos secos ou da vegetação, principalmente em áreas abertas, onde tem boa visão de suas presas potenciais. As larvas vivem no solo ou em madeira em decomposição e são predadoras de ovos, larvas e pupas de outros insetos. Adultos de Porasilus barbielinii possuem uma grande agressividade e capacidade de busca, predando preferencialmente adultos de Deois flavopicta, os quais representaram 92,4% dos insetos capturados em pastagens.

Mosca da família Asilidae – Foto: Frederico Salles

Dolichopodidae – A família Dolichopodidae é bastante diversificada em áreas tropicais. Variam de 0,8 a 9 mm de comprimento. Adultos são predadores de outros insetos menores e são facilmente reconhecidos pela coloração verde ou azul metálica ou amarelada. As larvas são predominantemente predadoras e algumas são fitófagas. As larvas são encontradas no lodo, madeira em decomposição, sob casca de árvore e serapilheira. Vem sendo relatado como importante inimigo natural de pulgões na cultura do trigo.

Mosca da família Dolichopodidae – Foto: Edwin Bellota (CC BY-NC-ND 2.0)

Syrphidae – Os adultos variam de 4 a 25 mm de comprimento, sendo moscas comuns, de colorido variável, com muitas espécies miméticas de vespas e abelhas. Voam muito bem e são capazes de pairar no ar. Algumas espécies são predadoras de afídeos, tripes e larvas de lepidópteros. Espécies do gênero Allograpta são relatadas como agentes de controle natural de pulgões em cultivos de cevada, de plantas frutíferas e de hortícolas.

Mosca da família Syrphidae – Foto: Frederico Salles

Hymenopteras predadores

Vespidae – Os vespídeos podem capturar uma grande diversidade de presas, apresentando possibilidades de utilização no controle de insetos-praga. A capacidade de forrageamento e seu potencial de predação poderá ser ainda maior em épocas de revoada de determinados insetos. Outro fator relevante é o raio de ação dos vespídeos. No Brasil, larvas, pupas e adultos do bicudo no interior das “maçãs” ainda verdes e fendidas foram predados pela vespa Brachygastra lecheguana (Latreille) (Hymenoptera, Vespidae). Além disso, são importantes agentes de controle do bicho mineiro do cafeeiro, Leucoptera coffeella (Guérin-Mèneville) (Lepidoptera, Lyonetiidae). E atuam regulando populações de outros insetos-pragas em cultivos de brássicas.

Humenoptera da família Vespidae (Vespa) predando um inseto – Foto: Katja Schulz (CC BY 2.0)

Formicidae  – As formigas, especialmente aquelas do gênero Solenopsis, são consideradas as mais eficientes predadoras dessa ordem e mencionadas como eficazes no controle de insetos florestais ou de insetos-praga em citros ou cana-de-açúcar, com uma grande contribuição para o controle biológico natural de Diatraea saccharalis (Fabricius) (Lepidoptera, Crambidae). Contudo, nos EUA, constataram que as formigas S. invicta e S. geminata (Fabricius) foram os mais importantes predadores desse inseto-praga, com uma capacidade predatória crescente ao longo do ciclo da cultura, atingindo 84,4% em uma das localidades estudadas. As formigas são importantes predadoras de pragas de insetos em culturas perenes, como frutas, vegetais, plantas ornamentais, grãos, café, cana de açúcar e algodão.

Formigas do gênero Solenopsis (Lava-pés) – Foto: Judy Gallagher (CC BY 2.0)

Neuroptera predadores

Chrisopidae – É a maior família de neurópteros do Brasil. Adultos são de tamanho médio, como Chrysoperla externa (Hagen), que mede aproximadamente 12 mm de comprimento. Geralmente são verde-claros, com olhos dourados.  O hábito alimentar dos adultos varia desde excreta açucarado e pólen, para Chrysoperla Steinmann, à predação, em Chrysopa Leach. As larvas de crisopídeos merecem destaque pela abundância e frequência com que ocorrem em um agroecossistema citrícola, constituindo-se em agentes efetivos na regulação da densidade populacional de insetos fitófagos. Tem ação observada em cultivos hortícolas também para diversos insetos e ácaros fitófagos.

Neuroptera da família Chrisopidae adulto – Foto Ivan Radic (CC BY 2.0)
Neuroptera da família Chrisopidae larva – Foto: Donald Hobern (CC BY 2.0)

Parasitóides

Vespas parasitóides

Braconidae – Os braconideos são parasitoides exclusivamente de insetos. Geralmente parasitam lepidópteros e dípteros. Entretanto praticamente todos os holometábolos são parasitados, com exceção dos Mecoptera, Trichoptera e Siphonaptera. Uma das espécies mais utilizadas dessa família, é o parasitoide Cotesia flavipes, sendo considerado o maior programa de controle biológico no mundo. Esse parasitoide é responsável por mais de 80% do parasitismo total da broca-da-cana. Outro organismo importante desta família é Diachasmimorpha longicaudata, parasitóide da mosca da fruta. Ele é encontrado em pomares de citros, maçãs e outras fruteiras atacadas por esta praga.

Vespa parasitóide da família Braconidae – Foto: David Marquina Reyes (CC BY-NC-ND 2.0)

Eulophidae – A biologia de Eulophidae é extremamente diversificada, sendo conhecidos como parasitas externos ou internos de numerosas famílias e ordens de insetos. No entanto, parasitam preferencialmente insetos das ordens Lepidoptera e Diptera, especialmente as espécies minadoras de folhas. Eles podem parasitar ovos, larvas e pupas. Um parasitoide desta família que vem sendo muito estudado e já vem sendo aplicado em pomares de citros é parasitoide Tamarixia radiata. Este parasitóide é muito importante para o manejo do psilídeo, a praga mais importante desta cultura.

Vespa parasitóide Tamarixia radiata deositando seus ovos em uma ninfa de psilídeo – Foto: U.S. Department of Agriculture (Domínio público)

Trichogrammatidae – Trichogrammatidae é uma das famílias mais utilizadas no controle biológico. As espécies dessa família são endoparasitas de ovos de Hemiptera, Coleoptera, Lepidoptera, Hymenoptera, Diptera e Thysanoptera. Tem-se utilizado este parasitoide para controle de insetos praga na cultura do algodão, cana de açúcar, soja e milho. A espécie Trichogramma atopovirilia é um importante parasitoide de ovos de Spodoptera frugiperda em cultivos de milho.

Vespa parasitóide da família Trichogrammatidae – Foto: Pierre Bornand (CC BY-NC 2.0)

Ichneumonidae – Os insetos da família Ichneumonidae são parasitas de larvas e/ou pupas de Coleoptera, Diptera, Hymenoptera e Lepidoptera. As fêmeas podem ovipositar entre pouco menos de dez até milhares de ovos. Os ovos de algumas espécies possuem um pedúnculo, através do qual o ovo é fixado externamente ao hospedeiro . Diadegma  é um gênero que parasita uma importante praga de brássicas, a Plutella xylostella.Também se tem utilizado o parasitoide Megarhyssa nortoni para o controle da vespa da madeira Sirex noctilio.

Vespa parasitóide do gênero Megarhyssa colocando seus ovos em insetos que vivem dentro da madeira – Foto Ken-ichi Ueda

Moscas parasitóides

Sarcophagidae – Os adultos da família Sarcophagidae possuem faixas pretas longitudinais ao longo do tórax e abdômen ornamentado com coloração entre cinza e negro. Variam entre 2 e 25 mm de comprimento. São, em sua grande maioria, ovovivíparos, com os ovos eclodindo em larva no momento da postura, o que provavelmente pode ser considerado uma adaptação para parasitar hospedeiros que se movimentam rápido. Parasitoide de Hemiptera (Cigarras, pulgões e cochonilha) e Lepidoptera..

Mosca da família Sarcophagidae – Foto: budak (CC BY-NC-ND 2.0)

Tachinidae  – A família Tachinidae são parasitoides relativamente generalistas, parasitando principalmente larvas de Lepidoptera, Coleoptera, Hymenoptera e ninfas e adultos de Hemiptera. Tachinidae é uma das maiores famílias de Diptera. Os adultos variam entre 2 e 20 mm de comprimento e são muito diversificados quanto a forma do corpo. Trichopoda pennipes, um endoparasitóide de ninfas e adultos de Nezara viridula, é um dos inimigos naturais de maior sucesso dessa praga importante na cultura da soja.

Mosca da espécie Trichopoda pennipes – Foto: Judy Gallagher (CC BY 2.0)

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